Ainda não pedi um crédito habitação, mas estaria a mentir se dissesse que nunca tentei perceber quais seriam as condições, e aquilo que teria de saber. Em todo o lado li coisas como “spread”, “taxa de esforço”, “amortização” e “FINE”, e mentalmente só acenava com a cabeça, a sentir-me completamente ignorante e até intimidado. Percebi que não tinha condições nenhumas para pedir um crédito, dado que não entendia nada daquilo (evito meter-me em coisas que não percebo).
Percebi nesse dia que a linguagem bancária, com os seus termos técnicos, é uma barreira. Por vezes, parece desenhada para nos manter em desvantagem na mesa de negociação.
Depois de anos a estudar este tema por paixão e necessidade, criei o meu próprio “descodificador”. E descobri que não precisamos de saber os 50 termos que eles usam. Precisamos de dominar os 5 que realmente importam. São estes 5 termos que te dão o poder, o controlo e o potencial para poupar milhares de euros.
A linguagem do crédito: onde o dinheiro se ganha (e se perde)
A maior parte da nossa vida financeira gira em torno do crédito. Dominar estes três conceitos é absolutamente fundamental.
1. A dupla dinâmica: spread e indexante (Euribor)
Quando pedes um crédito com taxa variável, o teu juro é a soma de duas partes. Perceber isto é o primeiro passo para uma boa negociação.
- O que aprendi: O Indexante (Euribor) é como o “preço de tabela” do dinheiro no mercado europeu. É igual para todos os bancos e nós não o controlamos. O Spread é a margem de lucro que o teu banco te cobra. É a parte negociável.
- A minha experiência: Quando me apresentaram a primeira proposta de crédito, o meu foco foi só um: negociar o spread. Perguntei “O que preciso de fazer para baixar este valor?”. Isto abriu a porta para discutir a domiciliação do ordenado ou a subscrição de outros produtos (as chamadas “vendas associadas”). Saber a diferença deu-me poder para negociar e poupar dezenas de euros por mês.
2. A tua arma secreta: a taxa de esforço
Antes de o banco te dizer quanto podes pedir, és tu que tens de saber qual é o teu limite.
- O que aprendi: A Taxa de Esforço é a percentagem do teu rendimento mensal que já está comprometida com o pagamento de créditos. A maioria dos bancos não empresta se esta taxa ultrapassar os 35-40%.
- A minha experiência: Antes de sequer pensar em pedir um novo crédito, eu calculo a minha própria taxa de esforço. É uma conta simples que me dá um teste de realidade brutalmente honesto. Se o resultado for alto, sei que a minha prioridade não é pedir mais dinheiro, mas sim reduzir as minhas dívidas existentes. É uma ferramenta de autodiagnóstico que te coloca a ti, e não ao banco, no controlo da decisão. Se queres aprofundar este tema, recomendo ouvir as dicas de especialistas como o Pedro Andersson, que já entrevistei para o blog.
3. O teu superpoder: a Amortização
Este é o termo que os bancos não fazem muita publicidade, porque é onde eles perdem dinheiro e tu ganhas liberdade.
- O que aprendi: Amortizar é simplesmente pagar uma parte do teu empréstimo antes do prazo. Cada euro que amortizas é um euro que deixa de render juros para o banco.
- A minha experiência: Assim que criei um fundo de emergência, o meu foco passou a ser a amortização do crédito pessoal que tinha. Cada vez que conseguia juntar 500€ ou 1000€ extra, em vez de os gastar, usava-os para abater na dívida. Ver o prazo do empréstimo a diminuir e a quantidade de juros que ia poupar foi uma das sensações mais poderosas da minha jornada financeira. Para perceberes o impacto, lê o meu guia sobre como ficar rico sem confiar na sorte, que fala muito sobre a importância de eliminar dívidas.
A linguagem da segurança: como te protegeres a ti e ao teu dinheiro
Num mundo digital, perceber estes dois conceitos é tão importante como fechar a porta de casa à chave.
4. A tua fortaleza e o ataque do inimigo: Autenticação Forte e Phishing
Estes dois termos são os dois lados da mesma moeda de segurança.
- O que aprendi: A Autenticação Forte é o mecanismo que o teu banco usa para te proteger, exigindo dois passos para confirmar que és tu (ex: password + código no telemóvel). O Phishing é a técnica que os burlões usam para tentar roubar esses dados, fazendo-se passar pelo teu banco.
- A minha regra de segurança, vinda da minha profissão: Tenho uma regra simples que nunca falha: o meu banco NUNCA me vai pedir a minha password completa ou códigos por email, SMS ou telefone. Se alguém o fizer, sei imediatamente que é uma tentativa de phishing. É a forma mais simples de te protegeres.
5. A “Bíblia” do teu contrato: a FIN e a FINE
Antes de assinares qualquer coisa, há um documento que tens de ler como se a tua vida financeira dependesse disso (porque depende).
- O que aprendi: A FIN (para créditos pessoais, etc.) e a FINE (para crédito à habitação) são fichas de informação padronizadas que resumem todas as condições do teu contrato: juros, comissões, custos totais, etc.
- A minha experiência: Quando me entregaram a FINE do meu crédito, não assinei nada nesse dia. Levei-a para casa e li-a com calma. Comparei-a com as de outros bancos. Foi nessa ficha que descobri comissões escondidas e que percebi o custo total do empréstimo ao longo de 30 anos. É a tua ferramenta de comparação mais poderosa.
Conclusão: o conhecimento é a tua maior poupança
Dominar estes termos não é sobre seres um especialista em finanças. É sobre teres poder, controlo e confiança quando falas com o teu banco. É sobre transformares uma relação de desvantagem numa conversa entre iguais.
Aprender a “falar banquês” foi algo muito importante para mim e que me permite garantir as bases necessárias para pedir um crédito com plena consciência daquilo que me vou meter. Partilha nos comentários se souberes de mais dicas!
O “Dicionário” de Bolso (todos os termos úteis)
Para referência, aqui ficam as definições rápidas de outros termos que podes encontrar:
- Amortização: é o reembolso ou pagamento de um valor que estava em dívida. A amortização pode ser parcial ou total.
- Autenticação Forte: é um procedimento de segurança em que o utilizador tem de usar dois ou mais elementos para se identificar, aceder a um serviço ou efetuar uma operação (como uma transferência). É usado, por exemplo, na banca online.
- Beneficiário: é o destinatário dos fundos de uma operação de pagamento, como uma transferência ou um cheque. Pode ser uma pessoa singular ou uma empresa.
- Carência (período de): período durante o qual o pagamento de um empréstimo, ou parte dele, é suspenso. Na carência de capital, só se pagam os juros. Já na carência de capital e juros, não se pagam juros nem capital em dívida.
- Cash advance: é um adiantamento que ocorre quando o cartão de crédito é usado para levantar dinheiro. O cash advance pode estar sujeito ao pagamento de comissões e juros.
- Central de Responsabilidades de Crédito: trata-se da base de dados que contém informação sobre os créditos concedidos, nomeadamente os que estão em incumprimento, na chamada Lista Negra do Banco de Portugal. Dela fazem parte as responsabilidades de crédito efetivas (como os empréstimos) ou potenciais (como os montantes disponibilizados mas não utilizados de cartões de crédito) dos clientes bancários (pessoas singulares ou empresas)
- Credor: é a instituição de crédito que emprestou o capital. Também pode ser designado por mutuante.
- Distrate de hipoteca: é o documento emitido pelo credor, uma instituição de crédito, quando a dívida de um crédito hipotecário (como o crédito habitação) está totalmente paga. Com este documento é cancelada a hipoteca no Registo Predial.
- Garantia de depósitos: representa a garantia de que os depósitos até 100 mil euros estão assegurados pelo Fundo de Garantia de Depósitos. Mas atenção, estas entidades devem estar devidamente autorizadas pelo Banco de Portugal.”
- Fiança: é a garantia prestada pelo fiador de que assume o pagamento de uma dívida, se o devedor entrar em incumprimento.
- FIN / FINE: a FINE (Ficha de Informação Normalizada Europeia) é um documento que o banco entrega ao cliente antes da contratação de um crédito hipotecário ou outro. A FIN (Ficha de Informação Normalizada) tem o mesmo objetivo mas aplica-se a outros produtos bancários, como o crédito pessoal, cartões de crédito ou depósitos.
- Indexante: é a taxa de juro utilizada como referência nos empréstimos e depósitos com taxa variável. A Euribor é o indexante mais utilizado.
- Intrabancária: é uma operação bancária (como por exemplo uma transferência) feita entre contas do mesmo banco.
- LUR: listagem de utilizadores de cheque que oferecem risco. É a lista de pessoas ou entidades que estão proibidas de utilizar cheques durante um período máximo de dois anos.
- Mecanismo Único de Supervisão: o Mecanismo Único de Supervisão (MUS) é o sistema de supervisão bancária que integra o Banco Central Europeu (BCE) e os bancos centrais dos países participantes, entre os quais o Banco de Portugal. Através deste mecanismo, todas as instituições de crédito destes países são supervisionadas de forma homogénea.
- Mutuário: é o devedor, ou seja, o cliente bancário a quem é concedido o crédito e que deverá reembolsar a quantia emprestada acrescida de juros.
- Ordenante: é o titular de uma conta bancária que autoriza uma ordem de pagamento a partir dessa conta.
- Phishing: é uma fraude eletrónica em que alguém se faz passar por outra pessoa ou entidade com o objetivo de obter indevidamente informações pessoais como coordenadas do cartão matriz, palavras-passe e números de contas.
- Preçário: é o documento constituído pelo folheto de comissões e despesas e pelo folheto de taxas de juro, disponibilizado pelas instituições de crédito nos seus balcões e online. Através do preçário, o cliente bancário acede aos custos de todas as operações bancárias.
- Risco de crédito: possibilidade de um devedor não ter capacidade financeira para pagar o valor em dívida. A avaliação do risco de crédito baseia-se num conjunto de critérios definidos pelos bancos para avaliar esse risco de incumprimento.
- SEPA: Single Euro Payments Area (Área Única de Pagamentos em Euros) diz respeito à uniformização de normas e regras de funcionamento dos sistemas de pagamento dos países onde é possível efetuar e receber pagamentos em euros (através de transferências, débitos diretos ou cartões de pagamento), com condições idênticas, os mesmos direitos e obrigações, independentemente da localização geográfica.
- Sistema de neutralização de notas: dispositivo antirroubo implementado em caixas automáticos (ATM) e nas malas de transporte de dinheiro para marcar ou degradar as notas roubadas.
- Spread: é a componente da taxa de juro definida pelo banco nos contratos de crédito com taxa variável. O spread é definido contrato a contrato, sendo somado ao indexante (normalmente a Euribor) para definir a taxa de juro total. Há ainda a ter em conta o spread base e o spread contratado.
- Taxa de esforço: é um valor, em percentagem, que corresponde à proporção do rendimento de um agregado familiar usada para pagar créditos. Calcula-se da seguinte forma: Taxa de Esforço = Encargos financeiros mensais / Rendimento mensal do agregado familiar x 100
- Vendas associadas facultativas (bundling): comercialização conjunta de produtos e serviços financeiros, associando um determinado produto base (como o crédito habitação) a outros produtos e serviços financeiros (como o cartão de crédito ou a domiciliação do ordenado), como contrapartida da melhoria nas condições financeiras. A sua aquisição é sempre facultativa.
Infografia original (CGD)




